A construção do Holocausto Brasileiro: ficção ou realidade?
Lançado em 2013, o livro “Holocausto brasileiro” da jornalista Daniela Arbex expôs a situação do antigo Hospital Colônia localizado em Barbacena, MG. A maior clínica psiquiátrica do Brasil. Eleito o melhor Livro-Reportagem do Ano pela Associação Paulista de Críticos de Arte (2013) e segundo melhor Livro-Reportagem no prêmio Jabuti (2014), vendeu cerca de 300 mil exemplares no Brasil e em Portugal.
Há o consenso de que aquele foi um verdadeiro campo de concentração, se tornando assim o Holocausto Brasileiro, em referência direta ao Holocausto Nazista da Segunda Guerra Mundial. Durante grande parte do século XX, pessoas foram mantidas de forma desumana. Encarcerados, recebendo eletrochoques e lobotomias (intervenção cirúrgica no cérebro). Bebendo esgoto e urina, passando fome ou comendo as próprias fezes. Dormindo amontoados para não congelarem no inverno. Corpos vendidos, internos trabalhando forçadamente e outros absurdos. Em seus anos de funcionamento foram perdidas cerca de 60 mil vidas. A obra trouxe luz às mazelas e torturas vividas por essa parcela do povo brasileiro. Excluídos. Renegados pela sociedade. Mulheres que não se encaixavam, gays, militantes políticos, mães solteiras, alcoólatras, mendigos, minorias, pessoas sem documento. 70% não tinham diagnóstico de doença mental.
Arbex retratou os maus-tratos da história do Hospital com veracidade e toques de floreamento textual e narrativo, uma certa literariedade que encobre muitas vezes o real. Características de um Livro-Reportagem, como, por exemplo, com entrevistados se tornando personagens. Além dos elementos de prosa que fogem do jornalístico, como quando a jornalista afirma com precisão a quantidade de pessoas em alguns momentos ao falar sobre os internos do Colônia em cantos do local. Como ela poderia obter a informação exata de quantos pacientes estariam agrupados aqui ou ali? Fatos imprecisos são inseridos no texto para compor a narrativa. Ato que não é comum no jornalismo diário.
As fotografias de Luiz Alfredo compõem a narrativa e dão rosto às palavras de Arbex. Estão ali para chocar e comprovar a tragédia. Elas confirmam as condições desumanas, superlotação e insalubridade do local e tornam a história um espelho da realidade e não só criação da autora. Além disso, documentos são colocados aos olhos do leitor, tal qual as carteiras de trabalho.
O trabalho iniciado com reportagens para o Tribuna de Minas, em 2011, foi aprofundado através de investimentos do bolso da repórter. Arbex relata ter entrevistado cerca de 200 pessoas de três diferentes estados e dá voz a 34 personagens no texto. A atuação no Tribuna chamou a atenção de fontes sobreviventes, dados foram cruzados e surge assim o retrato do Brasil.